29 de abr. de 2013

ORAÇÃO DA NOITE



Trabalhei, sem revoltas nem cansaços,
No infecundo amargor da solitude:
As dores,  - embalei-as nos meus braços,
Como alguém que embalasse a juventude...

Acendi luzes, desdobrando espaços,
Aos olhos sem bondade ou sem virtude;
Consolei mágoas, tédios e fracassos
E fiz, a todos, todo o bem que pude!

Que o sonho deite bençãos de ramagens
E névoas soltas de distância e ausência
Na minha alma, que nunca foi feliz.

Escondendo-me as tácitas voragens
De males que me deram, sem consciência.
Pelos míseros bens que sempre fiz!...

Cecília Meireles

26 de abr. de 2013

EPIGRAMA



Ó lua cheia,
ocular de um longo telescópio branco
que devassa o país dos amores platônicos...

João Guimarães Rosa,
In Magma

21 de abr. de 2013

EM PLENO LUAR



Em pleno luar
passeei por toda noite
em torno do lago.

Delores Pires
In: O livro dos Haicais

13 de abr. de 2013

SOLIDÃO



Imensas noites de inverno,
com frias montanhas mudas,
e o mar negro, mais eterno,
mais terrível, mais profundo.

Este rugido das águas
é uma sem forma:
sobe rochas, desce fráguas,
vem para o mundo, e retorna...

E a névoa desmancha os astros,
- terra e céu - guardando nome.
E os seus longos sonhos sábios
geram a vida dos homens.

Geram os olhos incertos,
por onde descem os rios
que andam nos campos abertos
da claridade do dia.


Cecília Meireles,
in Viagem

10 de abr. de 2013

NOITE



A noite, com sua 
partitura de mistérios
faz música.

Fecho os olhos
e ouço o som
do universo
como se fosse
um zumbido
de anseios e luz.

Caminho sobre 
a linha invisível
dos desejos.

Roseana Murray,
do livro No Cais do Primeiro Amor