27 de abr. de 2012

HOUVE TEMPOS


Houve tempos
Em que a mão erguia uma lanterna
E a noite se afastava um pouco, devagar.
Não se anulava.
A noite e o dia abriam sulcos para o silêncio como um rio
E a nosso lado caminhava sempre um espaço aberto.
Eu não recordo mas dizem
Que partíamos e voltávamos à casa
Como o sangue parte e volta ao coração.
Mar não havia
Mas pisávamos violetas.
A cama em que dormíamos era a do parto e a da morte,
O pão era solene
E a aurora familiar.
Nossos corpos então eram como jacintos
Vindos da terra lenta,
Lentos sob o abraço do linho.
O amor era tão longo ─
Tão curto o desvario.
Ah dêem-nos dêem-nos de novo
Aqueles corpos ignorantes e densos
E ouvidos para o silêncio
E boca para acreditar.



Maria da Saudade Cortesão,in
“O tempo Passado”

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