Por
estas horas de silêncio e solidão,
Eu
gosto de ficar só com o meu coração.
É nestas horas de prazer quase divino
Que eu me sinto
feliz com o meu próprio destino.
Por estas horas é que a cisma me
conduz
Por estradas de treva e caminhos de luz.
É nestas horas, quando
em êxtase medito,
Que sinto em mim a nostalgia do infinito.
Por estas
horas, quando a sombra estende os véus,
A fé me leva além dos mais remotos
céus.
É nestas horas de tristeza e de saudade
Que desperta em meu ser
a ânsia da Eternidade.
Por estas horas, minhas naus ousam partir
Para
Istambul, para Golconda, para Ofir...
É nestas horas, Noite amiga, em teu
regaço,
Que eu me difundo pelo Tempo e pelo Espaço.
Por estas horas eu
somente aspiro ao Bem,
Que em vida se tornou minha Jerusalém.
É nestas
horas, quando o espírito descansa,
Que me depões na fronte o teu beijo,
Esperança!
Por estas horas é que eu sinto florescer,
Como os astros no
céu, o jardim do meu ser,
É nestas horas de quietude que deponho,
Ó
Noite! em teu altar, minha lâmpada — o Sonho.
Por estas horas é que eu
gosto de sonhar,
Para ter ilusões brancas como o luar.
É nestas horas de mistério e
beatitude
Que a Glória me fascina e a Poesia me ilude.
Por estas horas
de tranquila e doce paz,
Quanta serenidade o espírito me traz!
É
nestas horas, quando a treva se constela,
Que ouço o teu canto nas estrelas,
Filomela!
Por estas horas, a minh'alma anseia por
Teu encanto,
Ventura! e teu engano, Amor!
É nestas horas de tristeza e
esquecimento
Que eu gosto de ficar só com o meu pensamento.
Por estas
horas eu me julgo Parsifal
Para ir pela renúncia à conquista do
Graal.
É nestas horas que, como um eco profundo,
Repercute no meu o
coração do mundo.
Por estas horas transitórias e imortais
Se
desvanecem minhas dúvidas fatais.
É nestas horas de harmonia
indefinida
Que eu tento decifrar o teu enigma, Vida!
Por estas horas,
meu instinto morre, com
A intenção de ser justo, o anseio de ser
bom.
É nestas horas de fantástico transporte
Que eu busco interrogar a
tua esfinge, Morte!
Por estas horas, eu me enlevo assim, porque
Vela
no lodo humano a luz que tudo vê...
Por tuas horas silenciosas,
benfazejas,
Deusa da Solidão, Noite! bendita sejas!
Da Costa e
Silva,
in Poesias Completas